Kim Cobb, cientista marinha no Instituto de Tecnologia da Geórgia,
nos EUA, esperava encontrar corais danificados quando mergulhou nas
águas azuis profundas de Kiritimati Island, um atol remoto do Oceano
Pacífico.Ainda assim, ela ficou chocada com o que viu. “Todo o recife estava
coberto com uma penugem marrom-avermelhada”, disse quando voltou para a
superfície. “É outro mundo. Algas têm crescido ao longo do coral morto.
Foi devastador”.
O dano em Kiritimati é parte de um branqueamento em massa dos recifes de coral em todo o mundo. Esse é o pior já registrado.Os cientistas acreditam que o estresse térmico de vários eventos
climáticos, incluindo o mais recente e severo El Niño, agravado pelas
mudanças climáticas, tem ameaçado mais de um terço dos recifes do
planeta. Muitos podem nunca se recuperar.
Crise que afeta uma grande população
Os recifes de coral são “incubadores” cruciais do ecossistema do
oceano, fornecendo alimentos e abrigo a um quarto de todas as espécies
marinhas, e apoiando populações de peixes que alimentam mais de um
bilhão de pessoas.Eles são compostos de milhões de animais minúsculos, chamados pólipos, que formam relações simbióticas com algas.Estima-se que 30 milhões de pescadores e famílias dependam dos
recifes para o seu sustento, mais de um milhão só nas Filipinas. Na
Indonésia, peixes suportados pelos recifes são a principal fonte de
proteína.
“Esta é uma enorme e ameaçadora crise planetária, e não estamos
fazendo nada sobre isso”, disse Justin Marshall, diretor do CoralWatch
na Universidade de Queensland, na Austrália.
O branqueamento ocorre quando calor
elevado e o brilho do sol fazem com que o metabolismo das algas – que
dão aos recifes de coral suas cores intensas – acelerem até saírem fora
de controle, e comecem a criar toxinas. Os pólipos recuam.Se as temperaturas caem, os corais podem se recuperar, mas alguns
podem permanecer vulneráveis à doença. Se o estresse de calor continua,
eles morrem de fome.
O perigo continua
Recifes danificados ou agonizantes foram encontrados a partir de
Réunion, ao largo da costa de Madagascar, até East Flores, na Indonésia,
e de Guam e Havaí, no Pacífico, até Florida Keys no Atlântico.O maior branqueamento, na Grande Barreira de Corais da Austrália, foi
confirmado mês passado. Em uma pesquisa com 520 recifes individuais que
compõem a parte norte da barreira, cientistas encontraram apenas quatro
sem sinais de branqueamento. Quase mil quilômetros de recifes, muitos
que anteriormente estavam em bom estado, tinham sofrido branqueamento
significativo.
Em pesquisas de acompanhamento, os cientistas notaram que metade do
coral que tinham visto havia morrido. Terry Hughes, da Universidade
James Cook, em Queensland, na Austrália, que participou da pesquisa,
advertiu que mais coral pode sucumbir se a água não se refrescar em
breve.
Eventos confluentes
Os cientistas dizem que o branqueamento global é o resultado de uma
confluência incomum de eventos, que aumentaram as temperaturas das águas
já elevadas pelas mudanças climáticas.Por exemplo, no Atlântico Norte, um bloqueio do fluxo normal do ar
polar para o sul em 2013 deu início ao primeiro de três invernos mais
quentes do que o normal, fenômeno que chegou até o Caribe.
Além disso, uma grande onda de calor formada no Pacífico no início de
2014, que se esticou ao longo da costa oeste da América do Norte,
aumentou em quatro graus centígrados a temperatura das águas
circundantes, e tem sido responsabilizada por uma série de fenômenos
estranhos, incluindo o encalhe de leões-marinhos na Califórnia e o
avistamento de um peixe tropical, gaiado, no Alaska.2015 ainda viu o mais poderoso ciclo climático El Niño em um século,
que espalhou calor através do Pacífico, branqueando recifes de
Kiritimati à Indonésia, e atravessando o Oceano Índico até Réunion e
Tanzânia.
Pior branqueamento mundial já registrado
“Estamos vivendo o mais longo evento de branqueamento mundial já
observado”, disse C. Mark Eakin, coordenador do Coral Reef Watch na
Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA. “E vamos perder
um monte de recifes durante este evento”.Recifes que levam séculos para se formar podem ser destruídos em
semanas. Corais individuais podem sobreviver a um branqueamento, mas
branqueamentos repetidos podem matá-los.Prever a duração deste branqueamento ou o próximo é difícil. Dr.
Eakin acredita que continue por mais nove meses.
Os cientistas não serão
capazes de medir a extensão total dos danos até que o evento esteja
terminado.O que está claro é que esses branqueamentos estão acontecendo com
frequência e ferocidade cada vez maiores. Eventos anteriores, em 2010 e
1998 (que matou cerca de 16% dos corais do mundo), não parecem ter sido
tão extensos ou prolongados.
Mudança climática
Recifes branqueados em 2014, como na Flórida e no Caribe, não tiveram
tempo de se regenerar antes de sofrer mais estresse térmico no ano
passado. Eles estão prestes a entrar em um terceiro ano consecutivo de
branqueamento, algo que nunca aconteceu antes.Ove Hoegh-Guldberg, diretor do Instituto de Mudança Global da
Austrália, observou que 2015 foi o ano mais quente já registrado, tanto
em terra quanto nos oceanos – quebrando o recorde estabelecido apenas no
ano anterior.“O aumento das temperaturas devido às alterações climáticas têm
empurrado os corais além de seus níveis de tolerância”, decretou.
No caso de Kiritimati, em 2015, a água no atol ficou 10 graus mais
quente do que o normal, e nunca se resfriou o suficiente para permitir
que o coral se recuperasse. “O pior aconteceu”, disse Kim Cobb. “Isso
mostra como as mudanças climáticas e de temperatura estão afetando estes
recifes no longo prazo. Este nunca mais será o mesmo”. [NYTimes]
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