A história do homem que foi professor por 17 anos sem saber ler


A história do professor americano John Corcoran é tão incrível que mais parece o enredo de um livro – que Corcoran não conseguiria ler até poucos anos atrás. Sim, trata-se de um professor do estado do Novo México que durante 17 anos lecionou em diversas áreas escondendo um doloroso e improvável segredo: ele não sabia ler nem escrever.


A história de John expõe não só seu sofrimento pessoal como o quanto o isolamento e a automatização do sistema de ensino como um todo podem destruir a autoestima, o aprendizado e até mesmo o futuro de uma criança. Tendo crescido com dificuldades de leitura e escrita, o próprio estigma provocado por essa questão fez com que John dedicasse todo seu esforço ao longo de sua vida escolar para trapacear e esconder o fato de que não sabia ler. Todas as mais incríveis táticas e estratégias foram utilizadas – desde colas e trocas de prova até o roubo das provas e de um móvel da sala do professor para poder descobrir as questões do exame.

John ainda criança

Quando concluiu a escola, John decidiu seguir à faculdade através de uma bolsa como atleta, em busca de um emprego melhor, e cada vez mais aterrado em seu segredo, sem conseguir jamais revelar ou enfrentar seu dilema. Seus esforços seguiram e ele se formou – e depois de finalmente conseguir sair do que considerava um cenário de guerra e prisão, ele voltou à academia, agora aceitando um trabalho como professor.


A bolsa de atleta o ajudou John a entrar na universidade sem precisar enfrentar seu analfabetismo
Como professor John ensinou de tudo: atletismo, estudos sociais e até digitação. Era capaz de assinar seu nome e de reproduzir palavras, mas incapaz de saber o que estava reproduzindo em sua caligrafia ou na máquina de escrever. A autoridade que lhe era conferida enquanto professor o protegia, e assim ele seguiu lecionando de 1961 até 1978.


Quando já tinha mais de 40 anos John decidiu contar para sua esposa a verdade sobre seu sofrimento de uma vida inteira. Ela não entendeu a profundidade do problema, e foi só quando o viu tentando ler uma história para sua filha foi que ela percebeu a gravidade daquele cenário. John, no entanto, só conseguiu de fato enfrentar o problema aos 48 anos, quando soube através da então primeira-dama Barbara Bush sobre o problema do analfabetismo adulto e de um imenso programa para alfabetizar esses adultos que atravessaram a vida toda sem saber ler nem escrever.

John e sua esposa com o presidente George Bush e Barbara Bush

John conseguiu uma tutora, e somente após sete anos de estudos conseguiu enfim se libertar do estigma e da encenação que havia sido sua vida inteira. Inicialmente ele havia decidido esconder sua história até o fim, mas foi para inspirar outras pessoas que pudessem estar sofrendo o que ele sofreu que enfim ele decidiu abrir o jogo e contar a todos sua história – inclusive em programas de TV.

Acima, John e uma de suas netas; abaixo, John com sua família

O relato de John visa principalmente denunciar o quanto o sistema de ensino é capaz de alienar crianças como robôs por uma máquina, sem que elas de fato aprendam coisas tão básicas quanto a leitura e a escrita – a fim de romper o que ele chama de um “ciclo de fracasso”. Ao enterrar seu “fantasma do passado” aos 48 anos, John iluminou um fantasma muito maior, que precisa ser enfrentado como um problema real – ao invés de enfrentarmos os alunos em dificuldade.


© fotos: Alamy

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