Á VOCÉ

À VOCÊ

Beijar o nácar, que te acende os lábios,
seria para mim prazer divino;
mas eu desprezo os risos da fortuna,
que podem profanar o meu destino.

Feliz de mim se repousasse um pouco
sobre o teu níveo seio que palpita:
mas fere a maldição os meus desejos,
a paz voara e te deixara aflita.

Em silêncio nasceu, cresce em silêncio,
este amor infinito, único, eterno.
Irei agora, abrindo-te minha alma,
exilar-te do céu, abrir-te o inferno?

Não, oh meu anjo, além escuto o eco
da maldição da nossa sociedade;
ouvi-lo, sem corar, não poderias,
expire pois a nossa felicidade.

Que importa o fogo que em meu peito lavra,
que importa a febre que me rói a vida,
se a tua correrá serena e pura,
de prazeres somente entretecida?

Roubar teu coração à paz dos anjos,
e nele despargir os meus amores,
oh! fora um crime, um sacrilégio horrível;
para puni-lo não houveram dores.

E, pois, para livrar-te ao precipício,
adeus, meu anjo, fugitivo corro:
rocem embora os teus, os lábios de outrem,
será breve o penar, porque já morro.

Sim, agonizarei talvez bem pouco,
porque meus dias estão pedindo graça,
oh! para possuir-te, afrontaria
infâmias, porém não tua desgraça.

Ao menos ficarás de um crime isenta,
o porvir para ti será de flores;
que importa que minha alma se torture,
se tu não sofrerás por meus amores?

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