A aterradora história da brasileira que foi submetida a uma laqueadura sem consentimento
O
professor de direito constitucional da Fundação Getúlio Vargas de São
Paulo, Oscar Vilhena, acaba de denunciar em sua coluna na Folha de São
Paulo um caso envolvendo Janaína Aparecida Quirino.
Janaína é mãe de cinco filhos e vítima da desigualdade social que permeia o Brasil.
Sem condições financeiras, a jovem circulou por abrigos da cidade de
Mococa, no interior paulista, até ser presa por tráfico de drogas. Há
sete meses cumprindo pena, Janaína acaba de ser vítima de um procedimento forçado de laqueadura.
O processo de violação, que não teve consentimento,
foi, pasmem, autorizado pelo Ministério Público, que na figura do juiz
Djalma Moreira Gomes Junior e do promotor Frederico Liserre Barruffini, obrigou o município a realizar o procedimento de esterilização. Segundo Barruffini “não havia dúvidas de que somente a realização de laqueadura tubária na requerida será eficaz para salvaguardar a sua vida”.
Pobre
e em situação de rua, Janaína Aparecida Quirino passou boa parte de sua
vida em situação de vulnerabilidade e ao ser impedida de ter filhos, é mais uma vez criminalizada e punida pela Justiça brasileira.
Falando do HuffPost Brasil,
a ativista Ana Lúcia Keunecke destaca a presença da violência
obstétrica, especialmente se tratando de um procedimento vetado pelo
Código de Ética Médico. “Não é
recomendado pelo CFM (Conselho Federal de Medicina), pela OMS, a
realização de laqueadura no momento da cirurgia cesariana porque isso
aumenta a probabilidade de mortalidade materna”.
Diante
da grande repercussão o Ministério Público de São Paulo emitiu nota
afirmando que já instaurou uma reclamação disciplinar para apurar o
caso. Contudo o MP salienta que o procedimento foi realizado com base em
decisão judicial.
Para o Instituto de Garantias Penais (IGB) a autorização para a realização do procedimento de laqueadura demonstra uma visão objetificada e com traços de eugenia do Estado sobre um problema social. “A
esterilização compulsória e eugênica, como a que se faz com os animais,
evoca O Processo kafkiano. Janaína K. acordou detida por pessoas que
não conhece, a fim de responder a processo judicial do qual não sabe o
motivo, movido por uma Justiça que agora rende à clientela típica do
direito penal os abusos em outras searas jurídicas”, diz o presidente da entidade e advogado Ticiano Figueiredo.
Racismo e criminalização da pobreza
O
caso de Janaína Aparecida Quirino revela uma prática comum da Justiça e
do sistema prisional brasileiro, a de criminalização da pobreza. O Brasil é dono da terceira população carcerária do mundo e cerca de 64% dos presos são negros.
A cada duas mulheres detidas nas penitenciárias brasileiras duas são negras. O Departamento Penitenciário Nacional (Depen) aponta que 68% da ocupação das penitenciárias femininas é de mulheres negras. Além disso mais de 50% das presas possui apenas o ensino fundamental incompleto.
Para
Nilma Lino Gomes, ex-ministra de Mulheres, Igualdade Racial e Direitos
Humanos, a criminalização de negras e negros pelos variados setores
demonstram uma visão perversa da sociedade.
“Os
dados que temos hoje sobre encarceramento das mulheres e das mulheres
negras caminham com essa articulação que hoje nós conseguimos fazer
tanto no campo das pesquisas, quanto de políticas públicas. Gênero e
raça, quando operam conjuntamente, revelam a perversidade de estruturas
desiguais em nossa sociedade”, declarou ao ITTC.
Fotos: Fotos Públicas/Valter Campanato/Agência Brasil
Comentários
Postar um comentário