Os 10 momentos políticos mais importantes da história das Olimpíadas modernas
Por ter todos os olhos do mundo voltados para o evento, é natural que os Jogos Olímpicos sirvam
também como palco para manifestações e eventos políticos. Considerando a
efervescência do atual momento brasileiro e mundial, é possível que no
Rio de Janeiro o mesmo se dê. Ora trágicos e descabidos, ora belos e
contundentes, esses momentos entraram pra história.Seguem aqui nessa seleção em ordem
cronológica os 10 mais importantes momentos políticos da história dos
Jogos Olímpicos modernos.
1. Jesse Owens e as olimpíadas nazistas (1936)
As olimpíadas de Berlim, em 1936, eram pra ser a grande propaganda mundial do nazismo. O Fuhrer Adolf Hitler
pretendia mostrar não só as benesses de seu governo em uma Alemanha
renascida, como provar, no campo, a superioridade da raça ariana sobre
qualquer outra raça. Seu único problema foi não ter combinado com o
atleta norte-americano Jesse Owens.
Owens não só venceu quatro medalhas de ouro no atletismo
bem diante do ditador nazista (inclusive os 100ms rasos), como o fez
afirmando um nada singelo detalhe para a teoria racial nazista: ele era
negro. O bizarro argumento da superioridade ariana ruía diante dos olhos
do povo alemão ao mesmo tempo em que Owens se tornava um herói – e a
segunda guerra mundial não havia sequer começado.
Em 1948, em Londres, na primeira olimpíada após o conflito, Japão e Alemanha não seriam convidados a participar.
2. A despedida da África do Sul e a reconquista da Etiópia em Roma (1960)
Abebe Bikila
Dois fatos marcaram o aspecto político das Olimpíadas de Roma, em 1960: a vitória do etíope Abebe Bikila na maratona, e a despedida da África do Sul dos jogos.Bikila tornou-se em Roma o primeiro
negro africano a ganhar uma medalha de ouro nos jogos. Mas esse não foi a
única simbologia de sua conquista: ele correu descalço, sob o sol
escaldante da capital italiana, e terminou a corrida batendo o recorde
mundial sob o Arco do Constantino, símbolo do poder romano. O detalhe é
que a Etiópia, seu país de origem, havia sido invadida por Benito Mussolini, justamente o ditador italiano, em 1936.
As olimpíadas de Roma foram também a
última participação da delegação sul-africana. Como sanção por conta do
regime racista do Apartheid vigente no país, o comitê olímpico decidiu
banir o país dos jogos, até que o sistema chegasse ao fim – o que só se
daria 32 anos depois, em Barcelona.
Placa na África do Sul regida pelo apartheid: “Ponto de ônibus para não-brancos”
3. O movimento negro nas Olimpíadas do México (1968)
1968 não foi um ano simples em lugar
nenhum do mundo. As ruas de Paris tornaram-se palco da famosa rebelião
estudantil, a União Soviética invadiu a Checoslováquia para acabar com a
Primavera de Praga, enquanto no Brasil a ditadura se endurecia ainda
mais, a tortura e as prisões corriam soltas, culminando no AI-5. Nos
EUA, Richard Nixon tornava-se presidente – e seguia, aos milhares e milhares de mortos, a inócua Guerra do Vietnã.
Alguns meses antes dos Jogos do México, duas mortes marcariam para sempre a história: o assassinato de Robert Kennedy, potencial presidente do país, em junho de 1968, e principalmente, o assassinato do ativista pelos direitos civis e negros Martin Luther King, em abril de 1968, que incendiou os EUA e o movimento negro no país.
Foi para protestar contra o racismo nos EUA que os corredores Tommie Smith e John Carlos
– medalhas de ouro e bronze nos 200 metros – subiram ao pódio trajando
meias negras sem sapatos, broches do movimento pelos direitos civis e,
ao som do hino americano, baixaram a cabeça e ergueram os punhos
cerrados, cobertos por uma luva também negra. Era a saudação do
movimento negro, e os atletas foram suspensos pela declaração política
que significavam seus gestos, mas saíram dos jogos para entrarem para a
história.
4. O atentado do Setembro Negro em Munique (1972)
A imagem mais marcante das Olimpíadas de
1972, em Munique, na Alemanha, não aconteceu em nenhum campo ou pista
durante nenhuma competição esportiva – sequer se deu dentro de um
estádio. O que entrou para a história foi a sinistra imagem de um terrorista membro do grupo palestino Setembro Negro, saindo na varanda do alojamento da delegação de Israel, com um capuz lhe cobrindo a cabeça.
O grupo de oito terroristas invadiu o
prédio e, após lutar com vários atletas, manteve 11 atletas israelenses
como reféns. Em troca, O Setembro Negro exigiu a libertação de 234 prisioneiros detidos em Israel. Diz a lenda que a logística local foi oferecida por neonazistas alemães, a fim de atingir o estado de Israel.
Israel rapidamente negou qualquer
possibilidade de negociação, O grupo exigiu aviões e helicópteros para
transporte, e o plano da polícia era preparar uma cilada para o grupo no
aeroporto. O plano, porém, foi incrivelmente mal executado, e o saldo
final foi catastrófico, resultando na morte de todos os reféns, um
policial alemão e cinco terroristas (três foram detidos). Os jogos foram interrompidos por 36 horas, e uma enorme cerimônia em repúdio ao atentado e tributo aos atletas foi realizada.
A bandeira de Israel, a meio pau, na cerimônia em tributo aos mortos no ataque
5. O maior boicote da história dos jogos, em Moscou (1980)
Os jogos de Moscou, em 1980, talvez tenham sido o mais pautado pela política de toda a história: nos estertores da guerra fria, 69 países aderiram ao boicote iniciado pelos EUA. A crise política, simbólica e mesmo esportiva foi tamanha que o Comitê Olímpico temeu pelo fim dos jogos modernos.
O motivo oficial do boicote foi a
invasão pela União Soviética ao Afeganistão, no ano anterior (vale aqui a
ironia de que os EUA ao mesmo tempo invadiam o Líbano e, em seguida,
Granada). Dentre os países que boicotaram estavam Canadá, Alemanha
Ocidental e Japão – França, Portugal e Reino Unido deram livre arbítrio
para os atletas decidirem, e acabaram participando com delegações
reduzidas.
A ausência dessas delegações afetou
severamente o nível das competições, e pela primeira vez nenhuma rede
americana de TV transmitiu os jogos. O mascote Misha,
um simpático ursinho que chorou na cerimônia de encerramento, tornou-se o
mais popular mascote da história dos jogos. No ano seguinte, como
contrapartida, os jogos foram realizados em Los Angeles.
6. O boicote do bloco comunista aos jogos de Los Angeles (1984)
A frase de duplo sentido no cartaz “Deixe os soviéticos disputarem (brincarem) sozinhos“
Na edição seguinte, foi a vez do bloco
comunista dar o troco, e boicotar os jogos de Los Angeles, em 1984. A
ausência dos países do leste europeu e de Cuba prejudicou imensamente a
qualidade dos jogos, tal qual na competição anterior.
Nas cerimônias, no entanto, não houve choro nem vela.
Diferentemente das olimpíadas soviéticas, os EUA não mencionaram
oficialmente em momento algum a ausência dos países do bloco comunista.
Curiosamente, essa foi a primeira participação da China que, apesar de
pertencer ao bloco, colocou-se de maneira isenta ao boicote. Da mesma
forma a Romênia, que conseguiu sua melhor participação
até hoje, ficando em segundo lugar no quadro geral. Simultaneamente aos
jogos de Los Angeles, os países que boicotaram realizaram os Jogos da Amizade, uma espécie de mini olimpíada com os países do bloco.
Selo comemorativo russo pelos Jogos da Amizade, em 1984
7. O fim da guerra fria e do Apartheid nas Olimpíadas de Barcelona (1992)
O novo contexto político que começava na
virada da década de 1980 para a década de 1990 foi completamente
representado nos jogos de Barcelona, em 1992 – o primeiro dos Jogos a
não sofrer boicote desde 1972. Com o fim da URSS, os soviéticos se
juntaram a mais 12 territórios e formaram a Comunidade dos Estados
Independentes, que viria a terminar em primeiro lugar no quadro geral de
medalhas. Além disso, a Alemanha recém unificada voltou a participar
como uma só nação, fato que não ocorria desde 1964.
O principal fato político a marcar as
Olimpíadas de Barcelona foi, porém, a volta da África do Sul como
participante. O país estava suspenso das olimpíadas havia 32 anos, por
conta do regime racista do Apartheid que comandava a política nacional
sul-africana. Nelson Mandela havia deixado a cadeia em
1990, e se tornaria presidente do país em 1994. Em 1992 o apartheid
ainda não havia oficialmente se encerrado, mas a própria participação do
país nos jogos ilustrava o enfraquecimento do horror que abateu a
África do Sul por impressionantes 46 anos.
8. O atentado à bomba nos Jogos de Atlanta (1996)
Memorial às vítimas do atentado em Atlanta
No dia 27 de Julho uma bomba explodiu
dentro do Parque Olímpico Centennial, sede dos Jogos de Atlanta, em
1996, matando duas pessoas e ferindo em torno de 150 outras. O autor do
atentado, Eric Robert Rudolph, era um norte-americano radical de extrema direita, e veio a ser preso em 2003, condenado à prisão perpétua.
Segundo Rudolph, que era ligado a
movimentos de supremacia branca e extremistas cristãos, o atentado se
deu como parte de uma guerrilha contra o aborto e a “agenda” homossexual que tomava conta do mundo globalizado, que celebrava ideais socialistas que, segundo seu comunicado, foram “perfeitamente expressados na canção ‘Imagine’, de John Lennon, tema dos jogos de 1996”. Seu plano era que os jogos fossem cancelados, o que não aconteceu. Rudolph permanece preso, no estado do Colorado.
9. As mulheres muçulmanas nas Olimpíadas de Londres (2012)
Ainda que tenha começado com uma
controvérsia na relação com os países islâmicos, os Jogos de Londres
terminaram como um marco na afirmação feminina em países mulçumanos.
Londres foi a primeira vez em que a Arábia Saudita, assim como Catar e
Brunei, enviaram atletas mulheres para os jogos.
A controvérsia se deu pelas Olimpíadas
terem sido realizadas em época paralela ao ramadã, período sagrado para o
islã, no qual seus praticantes renovam sua fé através de jejuns e
orações. Tal prática poderia deixar os atletas muçulmanos em
desvantagem. O COI não alterou a data das Olimpíadas mas, ainda assim, a
presença de mulheres nessas delegações terminou como uma vitória: pela primeira vez na história dos jogos, todos os países participantes enviaram delegações femininas.
10. A delegação de atletas refugiados nas Olimpíadas do Rio (2016)
Esse fato obviamente ainda não
aconteceu, mas de fato o COI aprovou a criação de uma delegação de
atletas refugiados para competir no Rio. Os refugiados entrarão antes do
Brasil – última delegação a entrar, como anfitriã – e carregarão a
bandeira olímpica .
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